quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

A Obra de Machado de Assis

   Joaquim Maria Machado de Assis é um dos mais importantes escritores da literatura brasileira. Nasceu no Rio de Janeiro em 21/6/1839, filho de uma família muito pobre. Mulato e vítima de preconceito. Podemos dividir suas obras em duas fases: Na primeira fase os personagens de suas obras possuem características românticas. Podemos destacar as seguintes obras: Ressurreição (1872), seu primeiro livro, A Mão e a Luva (1874), Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878). Na Segunda Fase, fase realista, ele abre espaço para as questões psicológicas de seus personagens. É a fase em que o autor mostra o realismo. Machado de Assis faz uma análise profunda destacando suas vontades, necessidades, defeitos. Nesta fase destacam-se as seguintes obras: Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1892), Dom Casmurro (1900) e Memorial de Aires (1908).Alguns contos que escreveu: Missa do Galo, O Espelho e O Alienista. Machado de Assis morreu de câncer em 1908.

   Esaú e Jacó foi uma das últimas obras publicadas por Machado de Assis, em 1904. O romance gira em torno da disputa entre dois irmãos, que é iniciada desde os tempos em que estão no ventre. Durante todo o romance, é mostrado o conflito entre os dois em busca da atenção da mãe, a disputa para mostrar-se superior ao outro e o embate pelo coração de Flora. Podemos ver também um claro enquadramento no contexto histórico da época, tendo fatos envolvendo a política bipartidária, a abolição da escravatura e o fim do Império com o início da República. Em um certo capitulo, Machado deixa clara sua opinião de que a mudança de império para república é apenas fachada, ao mostrar a dificuldade de um padeiro ao decidir o novo nome de sua confeitaria, se seria 'Confeitaria do Império" ou "Confeitaria da República", pedindo para o responsável pela escrita parar no "d". 

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Parnasianismo e Arcadismo, uma breve reflexão.

PARNASIANISMO

    O Parnasianismo surgiu no Século XIX na França. Apareceu como um movimento opositor ao Romantismo, tentando lutar contra o descuido textual e o sentimentalismo exagerado. O interesse pela beleza trouxe algumas características como a arte pela arte, objetividade, com textos rebuscados, o culto à forma e a valorização dos clássicos. O próprio nome dado remete à "Parnasos", o lar das musas na mitologia grega, e o estilo retomou conceitos da Antiguidade Clássica como o racionalismo. A principal característica parnasiana era a valorização do soneto, da métrica, da rima e foram os pontos mais importantes dessa escola literária.
Os principais autores são:
Alberto de Oliveira (1857 – 1937): Um dos mais típicos poetas parnasianos. Suas poesias se caracterizam por um grande preciosismo vocabular. Possui características românticas, porém não tão sentimental como os românticos. Obras: “Canções Românticas”, “Meridionais”, “Sonetos e Poemas”, “Versos e Rimas”.
Raimundo Correa (1860 – 1911): A visão negativa e subjetiva que tinha do mundo deu um certo tom filosófico à sua poesia, embora apenas superficialmente. Poemas:” Plenilúnio”, “Banzo”, “A cavalgada”, “Plena Nudez”, “As pombas”.
Olavo Bilac (1865 – 1918): Tentou estudar medicina e advocacia, porém abandonou as duas carreiras por gostar mais de artes plásticas. Além de poesias, também escreveu crônicas e comentários, que inicialmente foram publicados em jornais e revistas. Criou uma linguagem pessoal e comunicativa, não ficando limitado às idéias parnasianas. Escreveu: “A sesta de Nero”, “O incêndio de Roma”, “O Caçador de Esmeraldas” “Panóplias” e “Via Láctea”.
Estes três autores formam a conhecida "Tríade Parnasiana".
Profissão de Fé - Olavo Bilac

Invejo o ourives quando escrevo:
Imito o amor
Com que ele, em ouro, o alto relevo
Faz de uma flor.

Torce, aprimora, alteia, lima
A frase; e, enfim,
No verso de ouro engasta a rima,
Como um rubim.

Quero que a estrofe cristalina,
Dobrada ao jeito
Do ourives, saia da oficina
Sem um defeito:

Porque o escrever – tanta perícia,
Tanta requer,
Que oficio tal… nem há notícia
De outro qualquer.

Assim procedo. Minha pena
Segue esta norma,
Por te servir, Deusa serena,
Serena Forma.

               O poema Profissão de Fé de Olavo Bilac é um clássico do parnasianismo, pois engloba exatamente as suas principais características em apenas alguns versos. Na primeira estrofe se apresenta uma grande admiração do autor para com o ourives, com a delicadeza no qual ele consegue moldar uma peça com tanta perfeição. E assim segue na segunda e terceira estrofe, porém agora ele compara o trabalho do ourives com o de um poeta. O poeta por sua vez também molda as suas estrofes, para se tornarem perfeitas assim como as peças do ourives. Nas duas últimas estrofes, há um culto a poesia, como ela se fosse uma Deusa na qual o poeta deve sempre estar disposto a servir.


ARCADISMO
    O arcadismo é considerado o oposto do Barroco, pois possuía uma forma de poesia muito simples. Seus temas eram bastante comuns como o amor, a morte e o casamento. Supera os conflitos espirituais do Barroco, volta aos modelos clássicos da Grécia Antiga e possui poesia descritiva e objetiva junto com um ideal de vida simples, junto à natureza. Também era muito presente a idealização da mulher amada. Um de seus principais escritores foi o poeta Horácio, que foi quem influenciou o principal pensamento desta escola literária, o "carpe diem", ou seja, gozar a vida, viver agora.
Principais autores: Tomás Antônio Gonzaga (Dirceu): "Cartas Chilenas", Cláudio Manuel da Costa (Glauceste Satúrnio): "Obras", José Basílio da Gama (Termindo Sípílio): "O Uruguai".


SONETO XIV – Cláudio Manuel da Costa

Quem deixa o trato pastoril amado
Pela ingrata, civil correspondência,
Ou desconhece o rosto da violência,
Ou do retiro a paz não tem provado.

Que bem é ver nos campos transladado
No gênio do pastor, o da inocência!
E que mal é no trato, e na aparência
Ver sempre o cortesão dissimulado!

Ali respira amor sinceridade;
Aqui sempre a traição seu rosto encobre;
Um só trata a mentira, outro a verdade.

Ali não há fortuna, que soçobre;
Aqui quanto se observa, é variedade:
Oh ventura do rico! Oh bem do pobre!

               Este soneto de Cláudio Manuel da Costa exemplifica as características do arcadismo, em oposição às do parnasianismo. Enquanto o parnasianismo usa a arte pela arte sem se preocupar com o que acontece no presente, o arcadismo critica diversas faces da população brasileira e ainda assim cultuando o campo. Esse culto ao campo se mostra  nessas estrofes, na qual o poeta utiliza de diferentes meios linguísticos para mostrar o quanto a cidade só traz a discórdia para a vida das pessoas. Isso fica claro na primeira estrofe em que o poeta apresenta o motivo de as pessoas não morarem no campo, pois ou elas desconhecem o rosto da violência, ou nunca provaram da paz. Ao longo do soneto ele desenvolve mais essa ideia de que o campo deve ser valorizado e a cidade só é motivo de tristezas e traições. Para complementar no final, ele comenta que no campo é que tudo se equilibra, tomando isso como padrão de vida para o autor.


terça-feira, 1 de abril de 2014

Leituras Obrigatórias UFRGS 2015



Para o pessoal que for prestar vestibular na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, segue o site no qual informa todas as leituras obrigatórias para o ano de 2015. Como curiosidade: é a primeira vez desde o primeiro ano de utilização das leituras obrigatórias que a aparece um CD entre elas. O disco é Tropicalia ou panis et circensis, de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Os Mutantes e outros artistas.




QUEM SAI

- História do Cerco de Lisboa, do Nobel de Literatura José Saramago

- O Centauro no Jardim, de Moacyr Scliar

- Contos Gauchescos, João Simões Lopes Neto

- A Educação pela Pedra, de João Cabral de Melo Neto




QUEM ENTRA

- A Noite das Mulheres Cantoras, da Lídia Jorge

- O Amor de Pedro por João, de Tabajara Ruas

- Dançar Tango em Porto Alegre, de Sergio Faraco

- Tropicalia ou panis et circensis, de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Os Mutantes e outros artistas




Para quem for conferir a lista completa, fica o link abaixo:

terça-feira, 25 de março de 2014

Análise: Circuito Fechado - Ricardo Ramos

1

Chinelos, vaso, descarga. Pia, sabonete. Água. Escova, creme dental, água, espuma, creme de barbear, pincel, espuma, gilete, água, cortina,sabonete, água fria, água quente, toalha. Creme para cabelo, pente. Cueca, camisa, abotoaduras, calça, meias, sapatos, gravata, paletó. Carteira, níqueis, documentos, caneta, chaves, lenço, relógio, maço de cigarros, caixa de fósforos. Jornal. Mesa, cadeiras, xícara e pires, prato, bule, talheres, guardanapo. Quadros. Pasta, carro. Cigarro, fósforo. Mesa e poltrona, cadeira, cinzeiro, papéis, telefone, agenda, copo com lápis, canetas, bloco de notas, espátula, pastas, caixas de entrada, de saída, vaso com plantas, quadros, papéis, cigarro, fósforo. Bandeja, xícara pequena. Cigarro e fósforo. Papéis, telefone, relatórios, cartas, notas, vales, cheques, memorandos, bilhetes, telefone, papéis. Relógio. Mesa, cavalete, cinzeiros, cadeiras, esboços de anúncios, fotos, cigarro, fósforo, bloco de papel, caneta, projetor de filmes, xícara, cartaz, lápis, cigarro, fósforo, quadro-negro, giz, papel. Mictório, pia, água. Táxi. Mesa, toalha, cadeiras, copos, pratos, talheres, garrafa, guardanapo, xícara. Maço de cigarros, caixa de fósforos. Escova de dentes, pasta, água. Mesa e poltrona, papéis, telefone, revista, copo de papel, cigarro, fósforo, telefone interno, externo, papéis, prova de anúncio, caneta e papel, relógio, papel, pasta, cigarro, fósforo, papel e caneta, telefone, caneta e papel, telefone, papéis, folheto, xícara, jornal, cigarro, fósforo, papel e caneta. Carro. Maço de cigarros, caixa de fósforos. Paletó, gravata. Poltrona, copo, revista. Quadros. Mesa, cadeiras, pratos, talheres, copos, guardanapos. Xícaras. Cigarro e fósforo. Poltrona, livro. Cigarro e fósforo. Televisor, poltrona. Cigarro e fósforo. Abotoaduras, camisa, sapatos, meias, calça, cueca, pijama, chinelos. Vaso, descarga, pia, água, escova, creme dental, espuma, água. Chinelos. Coberta, cama, travesseiro.

2

Dentes, cabelos, um pouco do ouvido esquerdo e da visão. A memória intermediária, não a de muito longe nem a de ontem. Parentes, amigos, por morte, distância, desvio. Livros, de empréstimo, esquecimento e mudança. Mulheres também, como os seus temas. Móveis, imóveis, roupas, terrenos, relógios, paisagens, os bens da infância, do caminho, do entendimento. Flores e frutos, a cada ano, chegando e se despedindo, quem sabe não virão mais, como o jasmim no muro, as romãs encarnadas, os pés de pau. Luzes, do candeeiro ao vaga-lume. Várias vozes, conversando, contando, chamando, e seus ecos, na música, seu registro. Várias vozes, conversando, contando, chamando, e seus ecos, sua música, seu registro. O alfinete das primeiras gravatas e o sentimento delas. A letra das canções que foram importantes. Um par de alpercatas, uns sapatos pretos de verniz, outros marrons de sola dupla. Todas as descobertas, no feitio de crescerem e se reduzirem depois, acomodadas em convívio, costumes, a personagem, o fato, a amiga. As idéias, as atitudes, as posições, com a sua revisada, apagada consciência. O distintivo sem cor nem formato. Qualquer experiência, de profissão, de gosto, de vida, que se nivela incorporada, nunca depois, quando é preciso tomá-la entre os dedos como um fio e atá-la. Os bondes, os trilhos. As caixas-d’água, os cata-ventos. Os porta-chapéus, as cantoneiras. Palavras, que foram saindo, riscadas, esquecidas. Vaga praia, procissão, sabor de milho, manhã, o calor passado não adormecia. Um cheiro urbano, depois da chuva no asfalto, com o namoro que arredondava as árvores. Ansiedade, ou timidez, mais antes e após, sons que subiam pela janela entrando muito agudos, ou muito mornos. Sino, apito de trem. Os rostos, as páginas. Lugares, lacunas. Por que não instantes? As sensações, todas as de não guardar. O retrato 
mudando na parede, no espelho. Desbotando. Os dias, não as noites, são o que mais ficou perdido.

3

Muito prazer. Por favor, quer ver o meu saldo? Acho que sim. Que bom telefonar, foi ótimo, agora mesmo estava pensando em você. Puro, com gelo. Passe mais tarde, ainda não fiz, não está pronto. Amanhã eu ligo, e digo alguma coisa. Guarde o troco. Penso que sim. Este mês, não, fica para o outro. Desculpe, não me lembrei. Veja logo a conta, sim? É uma pena, mas hoje não posso, tenho um jantar. Vinte litros, da comum. Acho que não. Nas próximas férias, vou até lá, de carro. Gosto mais assim, com azul. Bem, obrigado, e você? Feitas as contas, estava errado. Creio que não. Já, pode levar. Ontem aquele calor, hoje chovendo. Não filha, não é assim que se faz. Onde está minha camisa amarela? Às vezes, só quando faz frio. Penso que não. Vamos indo, naquela base. Que é que você tem? Se for preciso, dou um pulo aí. Amanhã eu telefono e marco, mas fica logo combinado, quase certo. Sim, é um pessoal muito simpático. Foi por acaso, uma coincidência. Não deixe de ver. Quanto mais quente melhor. Não, não é bem assim. Morreu, coitado, faz dois meses. Você não reparou que é outra? Salve, lindos pendões. Mas que esperança. Nem sim, nem não, muito pelo contrário. Como é que que eu vou saber? Antes corto o cabelo, depois passo por lá. Certo. Pra mim, chega. Espere, mais tarde nós vamos. Aí foi que ele disse, não foi no princípio, quem ia advinhar? Deixe, vejo depois. Sim, durmo de lado, com uma perna encolhida. O quê? É, quem diria. Acredito que sim. Boa tarde, como está o senhor? Pague duas, a outra fica para o mês que vem. Oh, há quanto tempo! De lata e bem gelada. Perdoe, não tenho miúdo. Estou com pressa. Como é que pode, se eles não estudam? Só peço que não seja nada. Estou com fome. Não vejo a hora de acabar isto, de sair. Já que você perdeu o fim-de-semana, pôr que não vai pescar? É um chato, um perigo público. Foi há muito tempo. Tudo bem, tudo legal? Gostei de ver. Acho que não, penso que não, creio que não. Acredito que sim. Claro, fechei a porta e botei o carro par dentro. Vamos dormir? É, leia que é bom. Ainda agosto e esse calor. Me acorde cedo amanhã, viu?

4

Ter, haver. Uma sombra no chão, um seguro que se desvalorizou, uma gaiola de passarinho. Uma cicatriz de operação na barriga e mais cinco invisíveis, que doem quando chove. Uma lâmpada de cabeceira, um cachorro vermelho, uma colcha e os seus retalhos. Um envelope com fotografias, não aquele álbum. Um canto de sala e o livro marcado. Um talento para as coisas avulsas, que não duram nem rendem. Uma janela sobre o quintal, depois a rua e os telhados, tudo sem horizonte. Um silêncio por dentro, que olha e lembra, quando se engarrafam o trânsito, os dias, as pessoas. Uma curva de estrada e uma árvore, um filho, uma filha, um choro no ouvido, um recorte que permanece, e todavia muda. Um armário com roupa e sapatos, que somente veste, e calçam, e nada mais. Uma dor de dente, uma gargalhada, felizmente breves. Um copo de ágata sem dúvida amassado. Uma cidade encantada, mas seca. Um papel de embrulho e cordão, para todos os pacotes a cada instante. Uma procuração, um recuo, uma certeza, que se diluem e confundem, se gastam, e continuam. Um gosto de fruta com travo, um tostão guardado, azinhavrado, foi sempre a menor moeda. Uma régua de cálculo, nunca aprendida. Um quiosque onde se vendia garapa, os copos e as garrafas com o seu brilho de noite. Uma gaveta, uma gravura, os guardanapos de chave e de parede. Um caminhar de cabeça baixa, atento aos buracos da calçada. Um diabo solto, uma prisão que o segura, um garfo e uma porta. Um rol de gente, de sonho com figuras, que passa, que volta, ou se some sem anotação. Uma folhinha, um relógio, muito adiantados. Uma hipermetropia que não deixa ver de perto, é necessário recuar as imagens até o foco. Um realejo que não soube aos sete anos, uma primeira alegria aos quatorze, uma unha encravada e um arrepio depois. Uma fábrica de vista, um descaroçador de algodão, uma usina com a tropa de burros, são os trechos de paisagem com e sem raiz. Um morto, uma dívida, um conto com história. Um cartão de identidade cinzento e uma assinatura floreada, só ela. Um lugar à mesa. Uma tristeza, um espanto, as cartas do baralho, passado, presente e futuro, onde estão? Uma resposta adiada. Uma vida em rascunho, sem tempo de passar a limpo.

5

Não. Não foi o belo, quase nunca, nem ao menos o bonito, porque tudo se veio esgarçando em rotina, sombra com vazio. Não foi o plano, o projeto, a lucidez conduzindo, já que o mistério se fez magia e baralhou os búzios da vontade. Não foi o imaginado, o sonhado, mas a verdade miúda e comovida ser ter de quê. Não foi o tempo que abarca vastamente, não, deve ser o que se conta aos pedaços, recorta, em mesquinha soma, e medrosa. Não foi o prometido, o esperado, antes foram os enganos, os engodos, os adiamentos sempre roubos, pequenos e de importância. Não foi nada útil, ou de se repartir, apenas o de guardar para comer sozinho. Não foi o brilhante, de anel e de relâmpago, simplesmente a luz no vidro. Não foi o bom, foi o barato, não foi o alegre, foi o pouco a pouco, não foi o claro, foi o difuso, pois os encargos chegam logo, e se aprendem, e ficam. 
Não foi o momento certo, a maior parte aconteceu de repente, ou cedo, ou tarde, afinal não se repetiu. Não foi a viagem, a longa, larga viagem, de recordar, rever, que as paradas e os horários dividiram muito o roteiro, partiram, nublaram, não devolveram. Não foi o encontro nem a memória, não foi a paisagem nem o esquecimento, foi esse passar de pessoas e o seu reverso de imóvel que se isola e não fala, porque não adianta. Não foi a cidade mas a rua, não foi a figura mas a boca, não foi a chuva mas a calha. Não foi o campo, nem a mata, o morro, nem o rio, a relva, nem a árvore, nem o verde, foi a janela de trem, de carro, de longe. Não foi o livro aberto, a oração disfarçada, a primeira lição. Não foi a lâmpada, o linho, a lenda. Não foi a casa, o quintal, o corredor com portas e pé direito. Não foi o que vem de dentro, e sim o que bate, não se anuncia, e força, abre, e entra. Não foi o pacífico, o sem tumulto, foi até mesmo a guerra, ou melhor o combate, a escaramuça, perdidos de mãos nuas, limpas, as armas brancas. Não foi o amor, a certeza, o amanhã, foram as palavras que representam, a idéia de , o conceito, enfim, a sua redução. Não foi pouco nem muito, foi igual. Não foi sempre, nem faltou, foi mais às vezes. Não foi o que, foi como, e onde, e quando. Não, não foi.


Fonte: http://cesargiusti.bluehosting.com.br/Contos/textos/circuito.htm Acesso 25/03/2014




            Circuito fechado é um conto do autor Ricardo Ramos. Durante o conto, percebe-se que ele evita o uso de verbos. É preciso uma percepção aprofundada para captar a mensagem do autor. Nesse caso, é uma rotina limitada onde as coisas acontecem de um modo determinado por alguém. É uma rotina programada, em que a pessoa não é livre para realizar o que deseja.

           Isto significa que as possibilidades de expressão não têm liberdade e giram em torno de eixos de contenção. Não há garantia de nada, os fatos são breves porém o círculo vicioso continua. O espaço presente no conto são todos os lugares que o personagem(sociedade) frequenta para realizar as ações.

Análise: A instabilidade das cousas do mundo - Gregório de Matos



Nasce o Sol, e não dura mais que um dia,
Depois da Luz se segue a noite escura,
Em tristes sombras morre a formosura,
Em contínuas tristezas a alegria.

Porém se acaba o Sol, por que nascia?
Se é tão formosa a Luz, por que não dura?
Como a beleza assim se transfigura?
Como o gosto da pena assim se fia?

Mas no Sol, e na Luz falte a firmeza,
Na formosura não se dê constância,
E na alegria sinta-se tristeza.

Começa o mundo enfim pela ignorância,
E tem qualquer dos bens por natureza
A firmeza somente na inconstância.

Fonte: Spina, S. 1995. A poesia de Gregório de Matos. SP, Edusp.




               O poema de Gregório de Matos se baseia principalmente na efemeridade da vida. Vemos a partir da metáfora entre a vida do Sol e a noite, que é uma poesia que se trata sobre a transitoriedade dos fatos cotidianos, em que todas as alegrias se tornarão tristezas, ou seja, depois da luz, a sombra aparece. 
             O Gregório de Matos trabalha muito com pessimismo, presente fortemente no barroco. Utilizando antíteses, mostra os contrastes da vida. Já na segunda parte da poesia, as dúvidas ficam claras, somente perguntas aparecem. Por fim, se percebe o uso de antíteses tão fortes que se tornam um paradoxo, como nos últimos versos do 3º e 4º tercetos em que o poeta comenta “E na alegria sinta-se tristeza” e “A firmeza somente na inconstância”.

Análise: A Maria dos povos, sua futura esposa - Gregório de Matos




Discreta e formosíssima Maria,
Enquanto estamos vendo a qualquer hora
Em tuas faces a rosada Aurora,
Em teus olhos e boca o Sol e o dia:


Enquanto com gentil descortesia,
O ar, que fresco Adônis te namora,
Te espalha a rica trança brilhadora
Quando vem passear-te pela fria...


Goza, goza da flor da mocidade,
Que o tempo trata a toda a ligeireza,
E imprime em toda a flor sua pisada.


Ó não guardes, que a madura idade,
Te converta essa flor, essa beleza,
Em terra, em cinza, em pó, em sombra, em nada.


Fonte: Spina, S. 1995. A poesia de Gregório de Matos. SP, Edusp.


            A poesia é baseada na passagem do tempo e no envelhecimento das pessoas. Na primeira estrofe, as passagens tem uma relação muito forte com a beleza de Maria, afinal ela é uma mulher jovem. O eu lírico segue o mesmo pensamento na segunda estrofe, porém agora ele passa a elogiar seus cabelos. 
            Quando o terceto se inicia, ele começa a aconselhar a mulher, com dizeres para aproveitar a juventude. Pois quando o tempo passar, e ela chegar na velhice, perderá sua beleza, ou seja, a flor não brilhará mais. E essa perda do brilho vem acompanhada da morte, a qual vai transformar Maria “Em terra, em cinza, em pó, em sombra, em nada.”